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17/07/2025 05:30 ‧ há 3 horas por Folhapress
Economia
Justiça
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - O ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), validou nesta quarta-feira (16) o decreto do presidente Lula (PT) que aumentou as alíquotas do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras). A decisão anulou apenas a tributação sobre parte da medida do governo, que alterava a tributação sobre o chamado risco sacado.
A decisão atende parcialmente ao pedido do governo ao reconhecer o direito de o Executivo editar decretos para a fixação de alíquotas, mas derruba o dispositivo que incidia sobre o risco sacado -tipo de operação em que o fornecedor recebe à vista de uma instituição financeira e a dívida é quitada pela compradora em um prazo mais longo.
O ministro enviou a decisão para referendo do plenário da corte. Para isso, o presidente do STF, Luís Roberto Barroso, deverá pautar o tema para análise do colegiado após o recesso do Judiciário (31 de julho).
Segundo a decisão, as mudanças do IOF feitas pela Presidência têm validade desde a edição do decreto, em 11 de junho de 2025. Assim, haverá cobrança retroativa do imposto.
Com isso, operações de crédito, câmbio e previdência privada serão mais tributadas. Ficará mais caro, por exemplo, fazer viagens ao exterior. Até então, uma estratégia comum entre turistas era usar contas internacionais para reduzir o peso do imposto. Nessas operações, a alíquota caía de 3,38%, cobrada em cartões de crédito emitidos no Brasil, para 1,1%. Com a mudança, no entanto, a cobrança foi padronizada em 3,5% para as duas modalidades.
No caso das empresas, a alíquota anual para operações de crédito foi elevada de 1,88% para 3,95%, equiparando-se à taxa aplicada às pessoas físicas. Uma empresa que pega R$ 10 mil emprestados, por exemplo, por ano vai pagar R$ 395 com o reajuste. Até então, pagaria R$ 188 de imposto.
Nos últimos dias, integrantes do governo, do Congresso e do próprio tribunal discutiram uma saída negociada, para que fosse declarada inconstitucional apenas a tributação do risco sacado. Nesse caso, o restante do decreto, com o aumento de outras alíquotas de IOF, poderia ser mantido. A decisão de Moraes confirmou esse acordo.
A definição à questão foi dada por Moraes no dia seguinte à audiência de conciliação entre o governo e o Congresso sobre o tema terminar sem conclusão. O ministro argumentou que o governo extrapolou seu direito ao equiparar o risco sacado a uma operação de crédito.
"A Constituição Federal assegura ao Presidente da República a possibilidade de edição de decreto modificativo de alíquota do IOF, por ser importantíssimo instrumento de regulação do mercado financeiro e da política monetária, desde que, entretanto, se atenha às estritas limitações previstas na legislação, pois tem função regulatória e extrafiscal", disse Moraes, no despacho.
A taxação das operações de risco sacado renderiam R$ 450 milhões para o governo em 2025 e R$ 3,5 bilhões em 2026, de acordo com o Ministério da Fazenda.
Apesar de perder esta parte do decreto, auxiliares do petista consideravam importante que o STF reconhecesse, por outro lado, o direito do presidente de editar decretos que mudam alíquotas tributárias, sem o risco de ter a medida derrubada pelo Congresso.
Na decisão, Moraes diz que "não houve desvio de finalidade" na maior parte do decreto do governo. O ministro ainda incluiu argumento do Ministério da Fazenda segundo o qual a nova regulamentação promove maior "padronização normativa, simplificação operacional e maior neutralidade tributária".
Segundo integrantes do governo e do Congresso envolvidos nas negociações, a ideia de um acordo sobre a incidência do imposto sobre o risco sacado nasceu após o ministro do STF apontar restrições à medida.
Por outro lado, Moraes afirmou que há inconstitucionalidade na decisão sobre o risco sacado. "Não se tratou de simples alteração de alíquota -autorizada pelo art. 153, §1º, da Constituição- mas de introdução de nova hipótese de incidência tributária, sem previsão legal anterior que a ampare, configurando clara afronta ao princípio da legalidade tributária", disse.
O ministro fez referência a resolução de 2020 do CMN (Conselho Monetário Nacional) que define as operações de crédito e concluiu que não há essa previsão para o risco sacado.
"Não há, portanto, definição de operações de 'risco sacado' como operação de crédito, pois essas operações observam uma dinâmica diversa, não assimilável a empréstimos ou financiamentos. A operação de 'risco sacado', enquanto modalidade de 'antecipação de recebíveis', corresponde a uma transação comercial sobre direitos creditórios", escreveu Moraes.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou após a decisão que o governo estava confiante na tese de que o decreto respeitava a Constituição. "Houve essa questão do risco sacado que ele [Moraes] já tinha manifestado alguma sensibilidade em relação à controvérsia. Nós entendemos como absolutamente legítima a decisão dele, a Justiça é para isso mesmo, para sopesar os argumentos", disse. "Do ponto de vista regulatório foi muito importante porque a gente fechou algumas brechas de evasão e sonegação".
Haddad procurou fazer acenos ao Congresso, dizendo que os parlamentares têm ajudado o governo em determinadas questões -como a aprovação da proposta que eleva a arrecadação com petróleo. "Estamos ficando cada vez mais confiantes de que vamos terminar o ano com um bom resultado primário", afirmou.
Em nota, o Ministério da Fazenda afirmou ainda que está analisando os detalhes da medida de Moraes e que "a decisão contribui para a retomada da harmonização entre os Poderes e representa como o diálogo é fundamental para o retorno à normalidade institucional do país".
O advogado-geral da União, Jorge Messias, também divulgou nota em termos semelhantes. O texto afirma que a decisão é uma vitória da Constituição e respeita a separação entre os Poderes. "Sobre a ressalva sobre o 'risco sacado', contida na decisão cautelar, respeitamos o entendimento do ministro relator, por tratar-se de controvérsia nova, que efetivamente ainda suscita divergências."
O risco sacado é um tipo de operação que ficou mais famosa por causa da fraude no balanço financeiro da varejista Americanas. O fornecedor recebe à vista de uma instituição financeira, e a dívida é quitada pela compradora, num prazo mais longo.
Comum no varejo, o risco sacado não tinha cobrança de IOF até então. O governo Lula (PT), no entanto, afirmou se tratar de uma operação financeira e decidiu taxá-la com alíquota fixa de 0,95%. Após pressão do Congresso, recuou, eliminou a alíquota fixa e estabeleceu uma cobrança diária de 0,0082%.
O Congresso derrubou esse novo decreto em 25 de junho, e Lula recorreu ao Supremo para manter as alterações.
Quanto a outros trechos, como IOF-Câmbio, IOF-Seguro, aportes maiores em planos de previdência na modalidade VGBL (Vida Gerador de Benefício Livre) e o IOF aplicado a títulos e valores mobiliários (IOF-TVM), Moraes afirma que a alteração não destoa de outros de decretos presidenciais já referendados pelo Supremo em outras ocasiões.
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